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REVISTA MÉTODO ZELENY: TECNOLOGIA DE GESTÃO EXECUTIVA

A Indústria Faz a Mudança Cultural

Revista Método Zeleny: Tecnologia de Gestão Executiva
Como a Abrasipa, indústria paulista do setor químico, lidou com questões sensíveis como turnover, gestão de pessoas e processos para se manter líder mundial no setor.
A Indústria Faz a Mudança Cultural, Parte 2

RONALD DE OLIVEIRA CONCER

BAIXA ROTATIVIDADE E CULTURA
Margens altas oriundas da diferenciação dos produtos e pioneirismo sustentaram vantagens competitivas únicas durante um longo período. No entanto, diversos problemas, tanto de natureza operacional como administrativa encareceram as operações. Mesmo com uma trajetória de quarenta anos à frente do mercado, a Abrasipa chegou a um ponto de inflexão que se fez urgente a necessidade de mudanças drásticas para manter-se na liderança.

 

Em constante pauta nas linhas de montagem está a vertente da automação industrial. Esta aclama a substituição progressiva da mão de obra tradicional por recursos tecnológicos. O advento da tecnologia proporciona economia de escala, em busca de maximizar a produtividade uma vez que a adoção de sistemas tecnológicos totalmente automatizados tende a gerar maiores economias em termo de custo, o que não é o caso aqui. Mesmo que tal aspecto faça sentido para a indústria, é fundamental que o volume de produção seja elevado. Apesar da extensa carteira de clientes, a Abrasipa trabalha com lotes pequenos e vasta multiplicidade de produtos. Trata-se de uma indústria de nicho, que por consequência, é caracterizada como uma indústria de baixa automação. A tecnologia pode substituir o modelo de produção, no entanto, devido à escala de produção, o retorno não retribui investimentos adicionais em tecnologia.
 

Quando uma indústria não opera em plena capacidade ou possui níveis inferiores de produção, é razoável optar por alternativas não automatizadas, embora exija uma dependência maior de despesas correntes. Esta foi uma das situações enfrentadas pela Abrasipa: a empresa prolongou uma tradição de manter funcionários antigos dadas as limitações estruturais, seja formato da produção, acúmulo de know-how e até aspectos culturais.
 

Um dos princípios básicos da economia da estratégia versa sobre a curva de experiência, isto é, quando vantagens são criadas a partir do acúmulo de experiências. Esse tópico estabelece a redução dos custos unitários como resultantes da experiência adquirida com o tempo. De fato, tais reduções são significativas, entretanto, a gestão do know-how acumulado precisa ser feita com cautela. “Por um longo período, acabamos tendo muitas pessoas especializadas em pequenas coisas” conforme as palavras de diretor de operações da Abrasipa, Gabriel Leicand. Manter funcionários antigos fatalmente encarece as operações. Esse problema foi originado por alguns fatores. Primeiro, a empresa mantinha uma taxa de rotatividade dos trabalhadores muito baixa. “Chegou-se ao ponto de manter em seu quadro de trabalho funcionários com 30 a 40 anos de casa”, diz Gabriel. Essas pessoas ganhavam muito pelo tempo de casa, um comportamento que foi permissível pela empresa. Operando com baixíssima automação, a empresa também ostentava margens altas, fruto do seu pioneirismo e da qualidade dos produtos. Como exemplo, a Abrasipa contava com um lançamento de rebolo de borracha para polimento de vidro. Segundo Daniel Leicand, naquela época, o mercado vendia rebolos a uma média de R$ 8 por quilo, enquanto a Abrasipa vendia a R$ 40 por quilo. No entanto, o destino da elevada rentabilidade era sanar as ineficiências operacionais. A situação estava confortável para a companhia, mas, em determinado ponto, a folha salarial tornou-se cara demais.
 

O segundo aspecto reflete na cultura da própria empresa, baseada em um sentimento paternalista. Esta particularidade veio desde a primeira geração da empresa. Própria do seu fundador, Sr. Alexandre Leicand, que acolhia seus funcionários de forma familiar. Seu sucessor e filho, Daniel Leicand, seguiu por anos a mesma tradição. Daniel menciona que, mesmo houvesse conflito pessoais entre os funcionários, a situação não era imediatamente resolvida. Mantinham-se também funcionários pelo empenho em suas funções, apesar de serem pouco eficientes. Ainda, ele relembra que criavam vínculos, talvez por excesso de generosidade, o que, por muitas vezes parecia ser justo com aqueles funcionários. “A empresa era cara porém se pagava durante quarenta confortáveis anos, o que nos permitiu manter uma empresa dentro de São Paulo, pagando acima da média dos concorrentes, mantendo funcionários por 30 a 40 anos, estáveis e baixíssima automação”, acrescenta ele.
 

O baixo turnover e a estabilidade financeira começaram a dar sinais da necessidade de mudança de cultura. O mercado de abrasivos cresceu e se desenvolveu. Em virtude da substituição tecnológica, alguns produtos que trouxeram ampla vantagem tornaram-se comoditizados. Pressões externas aumentaram; primeiro por efeito do mercado aberto e a concorrência internacional. Além disso, surgiram concorrentes internos. Neste ponto decisivo, em que a discrepância salarial, desencontro com aspectos econômicos fundamentais, uma empresa deve apresentar diferencial de remuneração para atrair trabalhadores e não para mantê-los por tantos anos de casa. Tornou-se urgente a necessidade da mudança cultural.

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VANTAGENS DO BAIXO TURNOVER
É quase um clichê associar a baixa rotatividade com eficiência operacional. Embora seja relativamente fácil repor operários em linhas de montagem – pois, na maioria, não requer conhecimento formal especializado e os custos de treinamentos são baixos –, os impactos na produtividade vão além de questões econômicas.


Entre as abordagens relacionadas com o aumento da produtividade, está a corrente do capital humano, em que a produtividade em âmbito individual cresce conforme a acumulação de habilidades. Neste sentido, acontece por educação formal, treinamento específico ou até pela experiência individual da área de atuação. Outra corrente postula que a produtividade da empresa aumentará a partir das experiências adquiridas durante o processo de produção. Esta última, em especial, é verificada em linhas de montagem, comum quando operários têm pouca ou nenhuma instrução formal.
 

Quando a questão é manter a eficiência nas linhas de montagem, aspectos relativos à rotatividade são evidentes. Estudos recentes  demonstram empiricamente os efeitos do turnover na manufatura. Testado em indústrias de celulares na China, a amostra comportou a fabricação de 50 milhões de aparelhos ao longo de 4 anos de pesquisa. Os resultados apontaram que linhas de montagem com maior rotatividade geravam, em média, cerca de 2% a 3% a mais de defeitos nos aparelhos. Esse percentual equivale a custos de centenas de milhões de dólares. Ainda, verificou-se que a cada ponto de aumento na taxa porcentual de rotatividade (semanal), confirmou o aumento de defeitos nos produtos de 0,74% para 0,79%. Dentre as falhas mais comuns, constatou-se que 10,2% ocorreram nas semanas de maior rotatividade dos funcionários. Evidências deste tipo expõem a fragilidade, que não só está contabilizada nos custos de fabricação, treinamento, recrutamento e treinamento dos operários, mas, principalmente, está presente na confiabilidade do produto que depende do empenho e comprometimento dos operários.
 

Empenho e comprometimento não estão associados somente com remuneração. Estes sentimentos são oriundos da necessidade em recompensar a organização. O vínculo com a empresa decorre da valorização e confiança depositadas do funcionário além da recompensa financeira. Funcionários motivados e comprometidos beneficiam a empresa dando continuidade às atividades e exercem um papel positivo na identidade organizacional.
 

O pacto entre funcionários comprometidos e empresa que os valoriza proporciona vantagens mútuas, por exemplo, redução dos esforços em monitoramento, perdas por atrasos, questões sensíveis de gestão do conhecimento e economia em custos de treinamento. Estas ações inclusive encorajam novos funcionários competentes a escolher a empresa para trabalhar e seguir a cultura ali criada. Baseado em linhas de montagem, para as quais a tecnologia não é um substituto, este é um atributo fundamental para o sucesso.

Turnover no brasil

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Mudança Cultural

PROBLEMAS DO BAIXO TURNOVER
A crença comum sugere que baixos índices de turnover garantem o melhor desempenho de uma operação fabril. No entanto, isto é um equívoco. Manter funcionários por longos períodos, seja por confiança ou familiaridade com procedimentos, pode ser uma escolha arriscada. De forma similar, apostar em equipes de longa duração sob a alegação dos altos níveis de coesão, desenvolvimento de capacidades dinâmicas fruto da convivência podem originar problemas adicionais para toda a empresa.


O primeiro e mais óbvio é o custo da folha salarial. No caso brasileiro, os encargos trabalhistas previstos pela legislação oneram o empregador de forma desproporcional com relação às principais economias do mundo. A exemplo dos Estados Unidos, não há direitos como o 13º salário nos moldes brasileiros. Por lá, o empregador premia o funcionário com uma bonificação de acordo com o desempenho da empresa naquele ano. Diferente da exigência brasileira, que o salário é fixo, o valor da bonificação naquele país é bastante variável. Outras obrigações, tais como o fundo de garantia, aviso prévio ou férias remuneradas inexistem nas leis trabalhistas norte-americanas.
 

Fatores particulares da economia ou das adversidades institucionais podem, sim, encolher a margem operacional. Mas, há condições mais graves que frequentemente são pouco detalhadas. A maioria das empresas deixa de crescer não devido à ineficiência gerada por aspectos externos, mas sim, por pontos internos. Neste caso, as dificuldades não são restritas à falta de qualificação da mão de obra, tecnologia obsoleta ou à carência de investimentos. O ponto a ser discutido é mais crítico. Aqui, observa-se na relação entre funcionários: raramente analisado, este é motivo a ser averiguado a seguir. Diferente dos casos comuns em que soluções de problemas internos atendem lacunas pontuais, o comportamento de funcionários tende a ser o entrave mais oneroso de toda a operação. Apontam-se diversos tipos de condutas, manifestadas de vários modos, que fazem o empresário perder o controle de funcionários e equipes.

Para citar:

CONCER, R. (2024) Revista Método Zeleny: Tecnologia de Gestão Executiva. Relatório Anual. Disponível em https://www.ronaldconcer.com/

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